Não se conhece, exactamente, como terá surgido na mente do punhado de briosos lixenses que durante o ano de 1889 concretizaram na Lixa a fundação de uma Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários, a ideia da respectiva criação.
Os documentos factuais não existem — e a imprensa concelhia da época foi muito parca nas informações que imprimiu. Mas não andaremos longe da verdade se intuirmos que alfa e omega de tudo foi o sentimento de solidariedade humana que brotava generoso desses corações bem formados e a constatação de quão útil seria ao meio um corpo de bombeiros voluntários que nos momentos precisos acorresse a tentar salvar os haveres dos seus patrícios.
Certo, é que em 16 de Junho de 1889 o corpo de Bombeiros já tinha nomeado, e graduado, aqueles que seriam, respectivamente, o 1.º e 2.º Comandante — e que a 12 de Setembro de 1889 a Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Lixa nascia oficialmente, tendo por progenitores e por padrinhos, num mesmo tempo, os seguintes cidadãos locais:
- Ignácio Carlos de Carvalho Soares - 1.º Comandante
- António Pinto de Novais - 2.º Comandante
- Joaquim Augusto Coimbra - 1.º Patrão
- Alfredo Augusto Almeida - 2.º Patrão
- Joaquim Arnaldo Martins Ribeiro - Idem
- Abel Duarte Martins Ribeiro - Aspirante
Nomes que aparecem inscritos em livro destinado a «Matrículas de sócios activos, e ocorrencias dignas de mensão, relativas aos mesmos sócios; de 1 de Janeiro de 1890 a 31 de Dezembro do mesmo ano» tendo como data de alistamento o dia 21-4-89, a estes se juntando uns outros alistados a 14-12-89 — e que são os seguintes:
- Gonçalo Lopes Baptista - Bombeiro
- Joaquim Augusto Martins - Idem
- Joaquim Aurélio Pereira Guimarães - Idem
- Albino Martins da Cunha - Idem
- João Pereira - Idem
- Domingos da Cunha Moreira - Idem
- José da Silva - Idem
- Francisco Joaquim de Sousa - Idem
- Alfredo Mendes Adão - Idem
- Vicente da Silva e Cunha - Aspirante
- Casimiro Teixeira da Silva - Bombeiro
- Francisco António de Medeiros - Idem
- António Pereira - Idem
Homens novos, a idade de nenhum deles ultrapassava os 39 anos, com a particularidade do 1.º Comandante ter apenas 34 anos na altura do alistamento e o 2.º somente 26.
Profissionalmente, eram proprietários, negociantes, serralheiros, seleiros, alfaiates, pintores, carpinteiros, etc...
EM QUE DIA O PRIMEIRO DIA?... Analisando as datas transcritas, coloca-se-nos uma questão pertinente — para a qual não temos qualquer resposta. E essa é saber-se em que tempo, realmente, os caboucos da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Lixa começaram a ser lançados.
Em Mil Oitocentos e Oitenta e Nove? Pois muito provávelmente. Mas em que dia — e em que mês? Exacto parece ser que em 1 de Agosto de 1889 os Bombeiros Voluntários da Lixa já estavam em efectividade de serviço — conforme documenta «uma curiosíssimarelação das Associações de Bombeiros Voluntários existentes no país», relação publicada em 1 de Agosto de 1889 naquele que foi o N.º 1 da Revista «O BOMBEIRO» e onde, como se documenta, a fundação da Associação dos Bombeiros Voluntários da Lixa aparece referida a 16 de Junho de 1889.
Esta relação confrontada com uma local impressa no N.º 196 do jornal «O FELGUEIRENSE», que tem data de 1 de Junho de 1889 — e que transcrevemos abaixo — permitirá a dedução de que, como em tudo, haverá duas datas a citar como importantes no processo do nascimento da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários da Lixa: a da entrada efectiva da corporação de bombeiros ao serviço activo e a da legalização jurídica da Associação.
Mas veja-se então como «O FELGUEIRENSE» registou a primeira notícia sobre os Bombeiros Voluntários da Lixa: «Bombeiros Voluntários Vai constituir-se na povoação da Lixa uma corporação de bombeiros voluntários, da qual será director o sr. Ignacio Carlos de Carvalho Soares. Applaudimos esta resolução, que muitos beneficios póde prestar. Por uma subscripção já há o fundo necessario para a acquisição do material. »
BOMBA BRAÇAL — A PRIMEIRA VIATURA De que modo durante o verão de 1889 os primeiros voluntários lixenses socorreram haveres, é pergunta para a qual também se não tem resposta — desconhecendo-se embora se algum dia os seus serviços foram solicitados, ou mesmo em que local estavam aquartelados. (Presume-se que a sua primitiva casa estava implantada a meio do Largo Dr. José Joaquim Coimbra — actual Largo Dr. Eduardo de Freitas —, num quarteirão de casas que ali existia do lado nascente).
Provado já pode ser, entretanto, que «a primeira bomba para extinção de incêndios, que muito precisa ali era» chegou à povoação da Lixa nos primeiros dias de Novembro de 1889, porquanto «O FELGUEIRENSE» que saiu a 12 de Novembro desse ano já dava do facto a correspondente notícia.
Tratou-se da «BOMBA BRAÇAL» — «viatura» que ainda hoje existe e faz parte do museu da Associação.
Recordam os mais antigos que o seu funcionamento era alimentado a força de braços — isto é, «enquanto as mulheres carregavam a água os homens accionavam a bomba à força de braços», sendo a água atirada tanto mais longe quanto maior aceleração os homens dessem ao processo da bombagem.
Mais tarde, já na segunda metade dos anos vinte, e muito precisamente em 1925, a Associação adquiriu uma viatura da marca «Mercedes-Benz» pelo preço de Esc. 12.000$00 — carro que também ainda existe, funcionando com normalidade, mas com uma actividade que nestes tempos se limita à de «figurante» em desfiles festivos e/ou em cerimónias oficiais de bombeiros.
Após ser adquirida, a viatura teve naturalmente de sofrer as adaptações necessárias, trabalho que se prolongou por longo tempo e que, ao que parece, decorreu nas Taipas — regressando a «Mercedes» à Lixa quando entre a população já reinava uma certa descrença sobre o paradeiro do carro.
Daí a festa que aconteceu no dia da chegada, com muitas pessoas a aglomerarem-se no (então) Largo da Praça — actual Largo 1.º de Abril — para festejar o acontecimento, não obstante a chuva copiosa que caía.
Três anos depois, em 1931, Alberto Queiroz Abreu, Joaquim Medeiros e Assembleia Recreativa da Lixa, «por cotas iguais», ofereceram à corporação uma outra viatura equipada com motor — a DELAGE — automóvel do qual não existem outros vestígios que não sejam umas fotografias onde aquele aparece, mas em poses que não permitem a total identificação da viatura.
Entre a comunidade lixense ainda se encontra quem recorde esse automóvel e quem não deixe de sorrir pensando no apodo de «Delage» que alguém pôs ao quarteleiro dos bombeiros desse tempo, tão só pela razão do aspecto físico desse homem — no caso a sua corcunda — fazer lembrar a carroçaria da viatura. (Trata-se de Armindo Coelho, ou «Armindinho do Roberto», como também era conhecido, homem que habitava ali na Rua Dr. António Pinto de Carvalho Coimbra, a dois passos do quartel, portanto, e que tinha como principal ocupação a de garagista de bicicletas de pedal — que as de motor ainda não abundavam no nomento, continuando bem escassas no dia em que ele fechou para sempre os olhos).
Em 1949 a Direcção, presidida por António Ignácio Coimbra, adquiriu para a Associação um chassi «Studebaker», que posteriormente seria adaptado a pronto-socorro.
Em Março de 1964 chegava à Vila da Lixa a primeira ambulância dos Bombeiros Voluntários da Lixa — uma «CITROEN» — BOCA DE SAPO — carro ainda existente, embora fora de serviço, e que na altura da aquisição foi tida como a melhor e mais confortável das viaturas ao serviço dos bombeiros e dos doentes. A terra recebeu-a com júbilo — e da sua rapidez de locomoção muitos feridos ou doentes beneficiaram! Entretanto, e naquela hora efusiva, um grande desgosto acabariam por sofrer todos os que à Associação estavam ligados, bem como grande parte do povo da Lixa. É que, após ser recebida em festa no Quartel, a ambulância partiu para aquela que seria a sua viagem de baptismo nas estradas concelhias — não tardando a espalhar-se a novidade que na povoação da Longra a viatura fora de encontro a uma parede, acidente de que saiu algo danificada, pelo que teve de recolher logo à oficina, estando por isso imobilizada durante algum tempo.
Se até aí os serviços dos bombeiros da Lixa já eram solicitados, a partir do momento em que a corporação foi dotada com essa unidade, as chamadas passaram a suceder-se a um ritmo tal que obrigou logo a terem de encarar-se outras aquisições! O parque automóvel foi, assim, crescendo...